terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Lembranças...


Igreja de São Francisco,
centro hitórico




Igeja de São Pedro


Centro Histórico - Linha de trem


Centro Histórico - Intoca


Praia do Bessa






Intermares


                                                            Intermares - ninho de tartaruga

sábado, 26 de dezembro de 2009

Na Parahyba se faz com o sol o que se faz com a vida – parte 1

Como é seu nome? Peraí que vou lhe ensinar como se faz: Como é sua graça, por favor? Como é sua graça, por favor? Perguntei então. Bráulio Ferreira. Respondeu do alto da sua cadeira de rodas o senhor no asilo dentro da Mata do Amém, uma reserva florestal as margens do Rio Paraíba, em João Pessoa. Fazem apenas três dias que retornei é já aprendi uma lição que não vou mais esquecer.

 Certos resgates se fazem em momentos que não compreendemos bem, por estarmos demasiadamente absorvidos pelo viver aqui e agora. Ao mesmo tempo outros resgates são imediatos e se mostram no exato momento em que acontecem. Já se passaram mais de três anos desde que estive aqui, de onde escrevo, da minha terra natal. Depois de ir e voltar, para depois partir novamente, retornei com mais certezas do que quando me fui das terras paraibanas. Parece que está tudo no mesmo lugar, como deixei, apesar das coisas não serem as mesmas. Rever a família e descansar foram os propósitos desse curto regresso, mas não se pode regressar a algo que nunca se abandonou, mesmo que apenas no coração.

 Noite de Natal. Essa fiz questão de passar com voínha. Dona Netinha continua a mesma pessoa: complacente e prestativa, quase serviçal. Sentir o cheiro dela e da casa do meu avô reaviva um memória antiga que nunca se apagou, somente dorme. Depois da festa, sem a presença da família dividida por brigas fúteis de quem se ama e se odeia ao mesmo tempo, fui para casa de Emmy, minha prima e minha melhor amiga, para de lá fazer um programa familiar diferente.

 No centro histórico de João Pessoa, em meio às casas construídas durante a ocupação dos holandeses, eu revivia um programa que fiz muito quando morava aqui, curtir um som no Intoca. O bar é em uma casa antiga, perto do Hotel Globo, de onde se pode ver um dos espetáculos mais famosos da cidade: o pôr-do-sol no Rio Paraíba. A noite era de Natal do Jazz, só com bandas locais incríveis. A cultura Nordestina é algo tão presente na vida das pessoas aqui que quase se pode tocá-la nas esquinas, nos rostos, no ar... Músico aqui é profissional, “duro”, mais profissional. A noite começou com Cabeça de Galo, passou por Néctar do Groove e terminou alucinante com o show de Burro Morto. Ao fundo, nas grandes janelas do galpão antigo, nos fundos da casa, o dia foi amanhecendo na curva do rio, iluminando a mata ciliar que corre ao logo dele, na parte do centro da cidade. Entrei em catarse naquele momento, era como se nada mais existisse além daquilo.

 Amigos são a família que a gente escolhe. É o que dizem. Foi nas escadas da igreja do centro histórico, onde meu tio foi seminarista até desistir, que me reencontrei em conversa com alguns bons. Depois da noite de música e sonhos, a manhã foi vendo o dia brilhar no mar da praia do Cabo Branco. Na areia fiz uma oração, molhei as mãos, os pés e a nuca e agradeci com meu coração: Obrigado PAI! No fundo via a Ponta dos Seixas, ponto mais próximo da África no Brasil, então relembrei que sou Paraibano, Nordestino e humano, graças...

Nunca tinha vista em minha vida tantos carros como vi agora em João Pessoa. A cidade parece que cresceu mais rápido depois que eu saí daqui. Me reencontrar com uma Jampa ainda governada pelo PSB, com o prefeito Ricardo Coutinho reeleito com uma das maiores porcentagens do país, 80%, não foi surpresa. Também regressei depois de sair com um Cunha Lima no governo estadual - tucano de mais uma geração de políticos da mesma família. Dessa vez vi uma outra figurinha carimbada da roda viva da manutenção de poder familiar da política nordestina, um Maranhão. Depois de Cássio Cunha Lima ter sido cassado por compra de votos na eleição, o concorrente, José Maranhão, foi empossado, deixando sua vaga no Senado Federal para assumir a batuta do estado, mais uma vez.

 Vi na TV que a Estação Ciência, uma obra do estado e do município e mais novo ponto turístico da cidade tinha sido interditada, em plena alta temporada, por falta de documentação no projeto de drenagem superficial e ligação com a rede de esgoto. Meu Tio Duca, que assistia comigo disse: vê como as coisas são políticas, nem saneamento e rede de esgoto tem nessa área ainda! Mas aqui, diferente da realidade catarinense que vivo hoje, não há máscaras quando se trata em entender as relações de poder e as falcatruas polícias. Aqui todo mundo sabe quem é quem e porque faz o que. Mas mesmo com a “putaria” as claras, como eles aqui dizem, o status quô predomina dentro de um conformismo cultural.

 O povo Nordestino, pelo menos os daqui, é muito mais prático nos termo da vida do que no sul. As impressões que as pessoas fazem do Brasil são tão ilusórias e carregadas de preconceito que não consigo me confortar com a idéia de acreditar que conhecimento teórico é algo indispensável para uma leitura correta do que é vida social. Vejo atitudes de pessoas simples e, por muitos, consideradas alienadas e ignorantes, carregadas de uma sabedoria prática que tantos, mesmo com todo o amparo da teoria, não conseguem ter. Se a prática sem a teoria é manca – acho que Paulo Freire disse algo parecido – a teoria sem a prática é cega. Pra mim, hoje, a atitude de coerência sob os aspectos humanos mais essenciais deve vir antes de qualquer coisa, mesmo quando não amparada pela teoria. É que determinadas coisas são necessárias mesmo sem a gente entendê-las ainda, muito mais necessárias do que achamos. Inteligência não é uma questão apenas de conhecimento racional, é o equilíbrio entre o ser emocional, espiritual e racional. Isso não apenas contempla a minha condição de se colocar com humildade e admitir minha pequenês, mas reafirma uma existência indissociável da realidade que não é baseada apenas no materialismo fatalista e egocêntrico, que desconsidera uma existência que vai muito além de sociedade, cultura ou história, que transcende nosso restrito mundo dos sentidos e dos fatos terrenos.

 Na Mata do Amém, chegamos e já tirei minha câmera, louco para fotografar. Logo veio um homem, vestido de segurança dizendo: Senhor, não pode bater foto aqui. Perguntei por que e ele respondeu: Foi proibido pela coordenadora fulana de tal – não lembro o nome dela. Junto comigo uma amiga geógrafa, Andréia, disse: mas meu amigo, aqui é área pública, não pode proibir. E ele, humildemente, retrucou: são ordens da dotora moça. Pelo menos andamos um pouco, cruzamos a linha do trem que vai para Cabedelo, cidade portuária que antigamente era movimentada pela pesca da baleia, hoje quase morta economicamente, recebe visitantes para ver o Forte de Santa Catarina, com mais de 200 anos, construído para defender a foz do rio que dá acesso a Capital. Foi lá, na Mata do Amém que descobrimos o asilo onde seu Bráulio me ensinou uma lição. Qual é sua graça, por favor? Nunca vou me esquecer disso. Será que é porque quando perguntamos um nome ele deve ser uma graça? Será porque ele me dá seu nome de graça quando peço? Será que é pra dar mais graça a vida, aos humanos que se cruzam e fazem questão de saber seu nome? Só podia ter isso, essa lição de viver, na Mata do Além, de um homem chamado Bráulio. Que no acaso de um regresso me fez lembrar que viver é de graça, o que é caro é morrer sem viver.


Osíris Duarte 27/12/09

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

A sinceridade mora no silêncio moral

  Certas coisas não devem ser ditas, faladas ou comentadas. Certas coisas apenas devem ser sentidas. É que a palavra quase sempre esta carregada daquilo que queremos ou daquilo que almejamos. Carregada das nossas interpretações. O problema é que nem sempre nossa régua serve para medir os outros, temos nossa própria medita. 
  Sinceridade não é falar tudo que se pensa, ao contrário do que muita gente acredita. Muitas pessoas justificam grosserias, falta de educação e autoritarismo com a tal sinceridade. Pra mim, ser sincero é uma questão íntima, de veracidade para comigo. As palavras guardam uma força que muitas vezes extrapola nossas intenções.
  Existe sempre uma forma de dizer tudo sem dizer. Se talvez nos déssemos conta do quanto nossos atos falam por si, não falaríamos tanto. Existem temas e fatos que, quando ditos na sua raiz soam como cobrança, como apego, egocentrismo. É mais fácil esperar que o outro, por causa da sua “sinceridade”, compreenda suas atitudes, do que nós mesmos prestarmos atenção naquilo que fazemos. 
  Muitas vezes a sinceridade é apenas um apelo carente de alguém que precisa ser compreendido. Mas, e a compreensão do outro, onde fica? Colocar nos ombros de outro alguém as nossas necessidades de auto-compreensão existencial é fuga, insegurança, medo e egoísmo. Reparar nas atitudes dos outros sem refletir a respeito da própria atitude é um grito do ego que muitas vezes não percebemos.
  Então, ao invés de fingir ser sincero com os outros, talvez devêssemos ser sinceros de fato com nós mesmos, mas sem comprometer as relações com flechas de palavras atiradas no campo de batalha social. Antes de dizer algo ou questionar alguém, devemos fazer isso com nós mesmos. Antes de julgar as atitudes do outro, deveríamos analisar as nossas próprias atitudes, para não cometermos tantas injustiças. Tem gente que espera uma conduta do próximo sem se dar conta de que a sua própria conduta gera no outro aquilo que ela não quer sentir dentro de si.
  Não é fácil tal proposição. Eu mesmo luto todos os dias contra meus preconceitos, minhas desconfianças, meus ciúmes e meu ego, tudo em busca de ser justo comigo, me livrando das cobranças e culpas impostas por esse mundo que vivemos. Mas o que me entristece é ver que grande parte das pessoas não se propõe a tal jornada íntima. Tomam atitudes sem perceber os sentimentos e situações que elas geram no outro e no todo, tudo sob a falsa ótica de ser livre e de fazer aquilo que lhe apraz. Liberdade sem consciência é um cavalo selvagem solto no pasto. Ele é livre, mas para onde vai ninguém sabe.
  Se realmente queremos construir boas coisas de forma harmônica é necessário que entendamos nosso papel no mundo e como nos colocamos dentro dos contextos que vivemos. O respeito não está em permitir tudo com uma “liberdade” que beira a indiferença. O respeito está em saber transitar por tantos caminhos, consciente das repercussões que nossas atitudes têm perante a vida comum. Com tal consciência não há mais cobrança, há sim a retidão de uma conduta solidária e fraterna, onde ninguém precisa dizer como temos que ser ou o que temos que fazer.   
  Então ser sincero é algo que vai além do que dizemos. Então respeito é algo que não se cobra, mas sim o fato gerado pelo viver em comum, cientes das próprias falhas e humildes na forma como nos portamos perante o outro. Pelo menos é assim que penso, agora. Não me diga o que pensas se o que tens em mente não vale ser dito. Não me diga o que pensas se isso envolve o seu eu a se resolver. Antes de bradar, mastigue bem, se não as migalhas vão se espalhar nos rostos dos que estão a sua volta e, talvez, nunca mais você possa limpá-las dos rostos sujos. Vamos tentar nos manter atentos, controlando nosso impulsos, tudo em busca de aprender a respeitar a si mesmo e ao próximo, sendo sinceros realmente perante a vida.

Osíris Duarte   16.12.09

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Eu viajo é pra viver, não pra fazer turismo


  Eu adoro viajar. Conhecer novos lugares, pessoas diferentes, vivenciar novas experiências, tudo isso é combustível do viver, do apreender... Lugares diferentes ou já familiares guardam sempre novidades. O que faz de mim um viajante, não um turista, é a vontade do novo, do diverso. Atrativos como, beleza natural, diversidade cultural e descobertas existenciais são os principais motivos que me levam a se deslocar para outras paradas, novos pontos do planeta. Isso me põe em movimento com a vida, me relembrando que há muitas coisas além do que minha realidade cotidiana reconhece para experimentar. Viajar é assim: movimentar-se perante a vida.

 Segundo aquela enciclopédia da internet, que tem tudo e, muitas vezes não diz nada, embora não haja uma definição única do que seja Turismo, as Recomendações da Organização Mundial de Turismo/Nações Unidas sobre Estatísticas de Turismo, o definem como "as atividades que as pessoas realizam durante suas viagens e permanência em lugares distintos dos que vivem, por um período de tempo inferior a um ano consecutivo, com fins de lazer, negócios e outros.”.
 Ainda segundo o site, o turista é um visitante que se desloca voluntariamente por período de tempo igual ou superior a vinte e quatro horas para local diferente da sua residência e do seu trabalho sem, este ter por motivação, a obtenção de lucro.
 Então ser turista é viajar sem pensar no que se ganha com isso em termos monetários. O turista, de acordo com essa definição, viaja por prazer. Já o Turismo se caracteriza com uma atividade econômica, que visa à obtenção de lucro através da vontade “livre” das pessoas se deslocarem em busca do novo. Sendo assim, turismo pode ser considerado a forma de exploração econômica da vontade humana de se manter em movimento e vivenciar o novo.
  Aqui em Santa Catarina o turismo, não o turista em si, é levado muito a sério. Pelo menos no que diz respeito à propaganda do estado em relação às terras catarinenses como melhor destino turístico do país. Em 2009 o estado ganhou pela terceira vez consecutiva o título de Melhor Destino turístico do Brasil. Mas, afinal, o que isso significa de verdade para o povo catarinense?
 A bandeira do turismo como atividade econômica serve de justificativa para atitudes que pouco, ou nada, acrescentam no combate as mazelas sofridas pela população do estado. Crimes contra a sociedade e o meio ambiente são considerados atos idôneos e inteligentes quando tem como o argumento a tal geração de emprego e renda advinda da atividade turística. Isso sem contar o prejuízo à qualidade de vida das populações de cidades apoiadas no turismo como atividade econômica. A contradição entre fomentar o turismo para melhorar a vida da população fica clara quando, durante os meses de verão, ninguém consegue dormir devido ao barulho e transtornos causados em cidades que, muitas vezes, dobram de tamanho em população, devido a movimentação turística. E aí de quem tratar mal os visitantes! Afinal, eles são o sustento da localidade e, portanto, podem quase tudo, inclusive tirar o seu sossego.
 Segundo dados da Secretaria de Turismo do Estado, o número de turistas cresceu 4,5 milhões de visitantes/ano de 2008 a 2009. Atraídos pelas belas praias do litoral catarina e pelos “atrativos turísticos” como parques temáticos, resortes de luxo e o frio da serra, milhões de brasileiros e estrangeiros chegam ao estado loucos para desfrutar do que há de melhor em Santa. Eles trazem junto com a máquina fotográfica e a bagagem, dinheiro, muito dinheiro. Mas, afinal, pra onde vai esse dinheiro?
   Um dos principais argumentos do turismo é a geração de emprego. O número de empregos temporários triplica nas temporadas turísticas para cada região do estado. É o povo a serviço do povo, tudo para livrar algum no verão, por exemplo, antes que a normalidade volte e o desemprego seja o cotidiano. O fato é que a maior parte do lucro gerado pela atividade turística no estado fica nas mãos de poucos empresários, os mesmos que usam o patrimônio natural e a mão de obra catarinense para encher as burras de dinheiro. E, para eles, sempre haverá um governo de braços abertos, concedendo licenças ambientais fraudulentas para hotéis nas restingas e reservas, shoppings nos mangues e teleféricos nas morrarias. Mas tudo isso é justificável com algumas vagas de salva-vidas temporários, guias turísticos para três meses e garçons para o verão. Além de explorar o patrimônio coletivo, eles exploram o próprio cidadão. Dói ver que muitos, pela condição de vida a qual são submetidos, se sentem agradecidos com a “oportunidade”.
  Quando o dinheiro público não é gasto com esse tipo de empreitada vil, de bajulação dos empresários do turismo, como foi no encontro internacional realizado em Florianópolis este ano, onde endinheirados do mundo todo puderam dar voltinhas de helicóptero pela ilha, vendo de cima as áreas com potencial comercial a ser explorado, ele é gasto de forma ilícita com árvores de natal milionárias para inglês ver. Essa lógica desmedida e burra do turismo é um dos principais motivos para justificar a falta de saneamento básico na maioria das cidades do estado, a baixa remuneração de servidores públicos dos serviços de base, como saúde e educação, a péssima qualidade do transporte coletivo entre tantos outros problemas graves que vivemos o ano todo, não só nos verões litorâneos nem nos invernos da serra.
   Outra coisa que me deixa literalmente “puto” da vida é essa mania de gestores públicos fazerem obras as vésperas das temporadas turísticas. Sem demonstrar o mínimo de cuidado para com a população que o elegeu, eles travam vias em horários de pico, fazem buracos nas ruas nos dias de semana, pintam prédios e plantam flores, tudo para manter a falsa ilusão de que SC é um “paraíso”, o estado com melhor índice de qualidade de vida no país! Essas histórias de números e médias me dão arrepios, porque sempre disfarçam a realidade através de algo intangível como um dado estatístico. Enquanto pessoas de todos os cantos do planeta desfrutam das maravilhas de Santa Catarina, o povo fica no seu canto, esperando uma hora ou mais no trânsito da SC 401, na Capital, porque agora eles vão tapar os buracos para não esculhambar os carros dos visitantes.
  Eu fiquei com aversão ao turismo como atividade econômica. É o negócio mais nocivo que há para a qualidade de vida e desenvolvimento sustentável. È com ele que se justifica quase tudo em Santa Catarina, do melhor ao pior. Se a geração de renda vinda dessa atividade fosse realmente aplicada na qualidade de vida no estado, gerando empregos fixos e emancipadores, promovendo avanços, talvez eu não tivesse tanto nojo dessa palavra hoje. Quem sabe eu vá fazer um turismo fora daqui, tirar umas férias desse turismo de cá, pra ver se entendo porque tanta gente acha que acreditar na fada madrinha é melhor que enfrentar a bruxa.

Osíris Duarte  15.12.09

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Entendimentos



 Fico me perguntando por que as pessoas têm uma necessidade tão grande de entender o outro, mesmo sabendo no fundo que não compreendem a si mesmas. A compreenção da nossa existência não pode estar atrelada ao entedimento externo sem o discernimento do interno. Quando resolvi fazer este Blog, minha intenção não era a de ser ouvido e compreendido. A vontade de auto-compreensão foi o que me levou a publicar na net o que produzo.

  Neste espaço publico fotos, poemas, textos jornalísticos e literários, que nem sempre partem de um pressuposto considerado concreto. Aliás, tudo que considero concreto nessa vida parte de premissas que transcendem, na minha compreensão, o universo pragmático do cotidiano do sistema organizacional humano vigente.

  Idéias pré-estabelecidas não me trazem o gozo da liberdade que almejo. A reflexão que proponho está na perspectiva de construir algo novo, para que assim possa me sentir em movimento favorável em comparação à caminhada escura que a humanidade emprega nos dias de hoje. A confusão geralmente se instala quando nos apoiamos por demais em conceitos humanos da modernidade, que tolhem a capacidade de discernimento do ser integral, essencial. Hoje, mais do que nunca, minhas verdades são verdadeiras, são o que sou e não o que esperam que eu seja.

 Portanto, caro leitor, se você não entendeu ou não concordou com minhas colocações, sinta-se livre para questionar. Mas saiba que cada um de nós é um universo particular, que se desvela na medida em que nos propomos a nos descobrir por si mesmos. Tal vontade de descobrir a novidade, seja no âmbito intelectual, emocional ou espiritual, é o que me move a frente, sem me apegar ao que já foi. Por isso as perguntas que nos fazemos são muito mais importântes do que as que fazemos para os outros. Me questione, mas antes faça seus próprios questionamentos.

  Decidi não me culpar mais. O mundo de hoje nos impõe culpas para nos prender a sua malha. Eu quero me libertar. E se for necessário expor aquilo que sou, possibilitando uma amplitude maior da minha condição reflexiva em relação ao eu em mim, assim será. Assim uso e abuso de contradições, de redundâncias literárias e de confrontos com  meu ego, tudo na busca por algo que ainda não sei ao certo, mas que faz me sentir vivo.

Osíris Duarte  09/12/09

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

O Anti-socialismo revolucionário



 A expectativa que muitos criam em relação às correspondências de conduta, ou discurso, em relação aos paradigmas dos sistemas humanos de organização social vigentes, são meramente o reforço das mazelas causadas pelos mesmos ao convívio humano.  Esperam que eu seja mais um boneco do sistema, até nas coisas que parecem mais leves, menos significativas. Isolar-se é impossível, mas o despertar da consciência da dicotomia humana pode significar a disponibilidade para viver e compreender a vida de maneira mais abrangente, sem necessidade de cumprir com as cartilhas de sistemas humanos falidos, auxiliando a construir novas formas de organização social, baseadas em valores imutáveis e mais evoluídos.

  Constantemente somos cobrados pelo próximo a interagir de acordo com determinadas condutas. E essa cobrança se faz independente da consciência do cobrador em relação à individualidade do cobrado. Claro que tal consciência não representa um verdadeiro ato de esclarecimento, seguindo de respeito, em relação ao universo particular presente em cada um de nós. Certos ritos sociais e determinadas práxis da boa convivência são apenas reflexos viciosos da necessidade de domínio sobre o “outro” e alento em relação aos próprios medos e permissividade das responsabilidades humanas, projetadas ao próximo em tom de cobrança, corroborando assim com sua própria conduta e servindo de justificativa para a manutenção dela, mesmo sabendo no íntimo que ela é distorcida ou errada, e que a cobrança é uma mera projeção do íntimo de cada um.

  Desde que parei de comer carne e decidi me excluir de determinados ritos da sociedade humana, me tornei um ser anti-social. Esses pontos são só alguns exemplos particulares. Na verdade deixei de ser “sociável” quando me enveredei pelo caminho da auto-descobrimento. Na procura de minha identidade essencial, da minha autenticidade, cada vez mais venho desconsiderando as obrigações sociais que fomentam relações egocêntricas, dominadoras e cheias de apego. Os rótulos não me aprazem mais, os preconceitos somente confundem meu entendimento do mundo, distorcendo meu julgamento e meu discernimento. E isso não pode ser considerada uma demonstração de frieza ou indiferença, não quando o foco é a evolução própria que, consequentemente, beneficia o coletivo e clareia a conduta sob a luz da compreensão.

  Hoje é comum dissociar caráter de conduta. Pregasse a boa relação, valores elevados, justiça... Mas faz-se pouco para atingir tais metas. Nos discursos sempre estão presentes tais valores importantes: Amor, fraternidade, união, solidariedade... Mas muitas vezes essas palavras são somente palavras, nada mais. A participação em determinados ritos sociais somente reforça estereótipos burros, servindo para muitos como uma fuga da realidade a ser encarada e das verdades a serem vividas. Quando a boa educação serve para um propósito que não o amor ao próximo, ela é apenas um instrumento de dissimulação, que reforça a mentira dos rótulos que assumimos, disfarçando a conduta que realmente adotamos. Na política partidária esse exemplo é corriqueiro, não é?

  Ter me excluído de rodas de cervejada semanal, de churrascadas regadas a gargalhadas em meio à comilança, não me afastou da noção real que deve estar presente na forma como nos relacionamos, pelo contrário. Viver com mais certeza das minhas buscas e daquilo que sou aproximou muitas pessoas de mim. Parece que a necessidade de se descobrir atrai quem sente dentro de si o mesmo anseio. E sem me afastar de ninguém me aproximei de todos, estabelecendo os consensos nas relações que vivo sem mentiras. Não deixei minhas amizades, mas deixei meus amigos sim. Deixei com que eles trilhassem seus caminhos, empreendendo a mesma busca que faço comigo, busca essa repleta de alegrias e conquistas, muito maiores do que as vitórias meramente materiais.

  O afastamento de determinadas convenções sociais também me proporcionou a vivenciar as minhas próprias convenções. Assim me aprofundei ainda mais no que sou, dando chance para ver coisas que antes não podia ver, mesmo estando guardadas em mim. É assim que hoje caminho, no presente. A transitoriedade da vida, quando vivida, abre portas que antes nunca pareceram possíveis, ou que nunca passaram por nossas cabeças. Aí novas coisas, que antes eram desdenhadas ou não almejadas, passam a ter importância, tudo graças à impermanência da vida.

  Mas apesar dessa condição instável – que demonstra a constante busca por equilíbrio da existência, fato que nos ensina o caminho do equilíbrio em si – viver nos reserva verdades essênciais absolutas, como, por exemplo, o fato de coexistirmos. A condição biossocial do homem é algo factual. A interdependência existencial das individualidades humanas está sempre presente na construção de rótulos e máscaras, mas eles só se constróem porque não possuímos, ainda, a firmeza em nossas reais identidades, nosso eu integral. Assim, para nos sentirmos parte da sociedade, assumimos os paradigmas pré-estabelecidos pelo sistema de organização humana, feito pelos próprios homens, que desconhecem a profundidade real que reside dentro deles mesmos.  Antes de estabelecer paradigmas é necessário conhecer o terreno onde essas referências se apóiam. Em um mundo que se apresenta tão caótico, será mesmo que conhecemos a terra onde pisamos?  Será mesmo que nos conhecemos? A pergunta filosófica fundamental não é só apenas um devaneio intelectual de boêmios na madrugada, é necessidade existencial. 

  Nossos valores incorruptíveis são inquestionáveis e independentes da vida dentro do sistema humano. A nossa dependência simbiótica do bioma terrestre, nossa necessidade de tolerância e paciência em relação às diferenças na busca pela paz, nossa necessidade de amor recíproco e de harmonia nas relações são coisas que todos nós, quando abdicamos por um momento do nosso ego inchado e da nossa cegueira arrogante, sabemos o quanto são verdadeiras e inquestionáveis. Portanto, se não nos falamos há muito tempo, se não apareci na festa, se faço questão de não falar sobre determinados pontos de vista, condutas ou temas, é porque me amo tanto quanto amo você. E não passarei por cima do teu livre-arbítrio, não vou tirar teu mérito em descobrir quem és realmente. Não hei de sugá-lo para justificar meus erros e não vou cobrá-lo por aquilo que devo esperar apenas de mim, assim como eu espero ser respeitado na particularidade do meu íntimo autoexistente, o eu e eu no balé da vida.

Osíris Duarte – Jornalista

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Páginas erradas de uma vida certa

Páginas erradas de um livro antigo, que carrego comigo a tira colo. O que há de errado em ser sensível? Será que passa ao largo desse sonho intercalado de tristes detalhes do destino? Do outro lado da rua imaginava o que fazer quando passar pela faixa de pedestre e chegar à calçada de casa. São pensamentos como esse, estranhos e turvos, que me dão a esperança de que algumas de minhas lembranças não se percam no ostracismo da vida cotidiana.
   É assim, confuso e poético. Dialético no discurso, mas egoísta nos desejos. Afinal, será que existe algo de errado em ser egoísta? Era meia noite, e ele na pista, sem um auto, ficou a contemplar a paisagem. São tantas coisas que passam despercebidas que nem mesmo o que valeria a pena fica gravado na memória. Divagar assim, ao léu, é um exercício constante, quase como um cacoete. O sonhador é aquele que se perde em suas divagações e almeja fazer concerto de tudo aquilo que é incerto na construção de suas fantasias. Portanto, nada daquilo que passou em sua mente se tornou realidade, nada daquilo que sonhou sem objetivar se tornou um propósito, mas tudo isso serviu e serve de alimento para o intelecto a para o espírito.
   De vez em quando ele pensa demais. Pensar, exercício de ociosos, é aquilo que mais lhe apetece. E mesmo sendo taxado de inteligente, nunca se deixou abalar pelos apelos da vaidade. Ai que vem suas dúvidas, porque mesmo se achando isento de vaidades desnecessárias, não seria essa pretensão também uma vaidade? O lagarto escreve! Era assim que se via, um lagarto, que fica no sol recuperando energias para caçar na noite fria.
   São anos de experiência em divagação. Deveria existir um curso universitário, talvez assim ele pudesse concretizar o mestrado de “alguma coisa” que desejava fazer. Talvez fosse só mais uma fantasia, é isso! Sonho e fantasia, duas coisas diferentes e que são confundidas por muitos a todo o momento. Afinal, sonhar sempre tem um fundo de verdade, de meta, de objetivo. Ao passo que fantasiar era mera divagação, devaneio sem direção, exercício do ócio. São desses filósofos do cotidiano burro que é feita à argamassa social, ou você acha que todo filosofo é inteligente? Na maioria são incompetentes, que por falta de capacidade de concretizar seus sonhos idílicos, ficam em algum lugar entre a inércia e o vazio. Mas existem os filósofos inteligentes. Aqueles que não fazem da filosofia apenas um parâmetro para sobrevivência intelectual e conquista de status na pretensa sociedade do conhecimento.
   O padecer da vida é uma ferida que arde em chamas na cama da ignorância. E por isso ele prefere, dentre todos os seus rótulos, o de poeta. Pelo menos assim sua associação com imagem de pessoa fica gravada em algo belo, tênue, mas belo. Se bem que nem tudo que para nós parece ser subjetivo é tanto quanto pensamos. Partir do princípio que somos inúteis é apenas corroborar com os que tentam incutir na nossa mente, através da televisão, da política e da informação desnecessária, essas inverdades existenciais. É que no final somos colocados em um patamar tão diminuído em relação às coisas já construídas e convencionadas, que ser humano é o de menos. E ser humano envolve muito mais do que aquilo que os olhos podem ver, ou a ciência pode provar. Isso já é dito sabido por todos, mas ninguém quer levar a sério, só na mesa do bar da esquina, quando não temos mais obrigações com nossos companheiros de mundo bandido e marginal.

Osíris Duarte 




terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Crônica: Um Real



 Ele enfrentou os dois sujeitos enormes. A briga era inevitável. Pensou, será mesmo que não posso evitar? No mesmo segundo a vista escureceu. Ele pos a mão na boca, sangue... Em meio à confusão de sua cabeça, atordoada pela pancada, nem percebeu o segundo golpe, na boca do estomago. Suas entranhas se retorceram dentro do ventre, a respiração travou. Buscava o ar mais era como se não houvesse o que respirar. De súbito perdeu o chão, para logo em seguida reencontrá-lo com as costas. Até que foi uma boa queda, o impacto lhe fizera voltar à respiração. Ficou ali, no chão vermelho de barro seco. Esperava a ira dos seus agressores aplacar. Mas como se não bastasse, o golpe final foi desferido. O chute da bota de couro lhe roubou dois dentes. Essa ira que toma conta dos homens fracos é sempre baseada em motivos fúteis. Violência, o verbo dos tolos.
 O carnaval alegre tinha um desfecho amargo, com gosto de sangue. Meia noite, já é quarta-feira de cinzas. E toda essa confusão por causa de um olhar despretensioso para o tal, o agressor. Nunca mais iria olhar as pessoas na rua. Não havia nenhum questionamento ou interesse naquele olhar rápido. Foi um ato involuntário, de quem anda na rua observando. Bem que imaginava, quem muito observa algo procura. E mesmo não estando à procura de briga, achou. Nem sempre o que encontramos é o que queremos. Incrível como alguns homens têm tal necessidade de auto-afirmação. A força, geralmente, é a forma mais rápida de afirmar o que se deseja. Todas as forças por sinal. Seja física, psicológica ou política. Pobre homem, tão fraco.
 Ele levanta do chão como quem levanta cedo da cama, devagar, meio moribundo. Ao lado do sapato algo cintila. Ele não vê bem o que é. Os óculos se perderam na briga. Ele abaixa e, com um sorriso desfalcado e ensangüentado, recolhe uma moeda de um Real. Não era dele, estava duro, achou. Sem exitar exclama:

- Mais que sorte, um Real!
Ele põe a moeda no bolso, agradece a Deus, e vai para casa sorrindo. Um Real mais rico.   

Osíris Duarte