Os dóceis animaizinhos, alegres e simpáticos habitantes do mar, os golfinhos, nunca imaginariam que serviriam de bode-espiatório para as justificativas da imprensa e de alguns catarinenses em relação à mudança de endereço do futuro estaleiro do bilionário bonitão Eike Batista. Os pobres bichinhos, caçados até quase extinção em algumas partes do mundo, agora servem de argumento para diminuir a importância da não instalação desse empreendimento, que ameaçava a qualidade de vida de milhares de catarinenses, comprometendo fontes de renda importantes para o estado como o turismo. Colocar a culpa nos golfinhos é de uma conveniência argumentativa para os defensores do projeto que soa quase como piada.
Um dos principais pontos de defesa do “bendito” projeto do estaleiro são os tais 14 mil empregos que o empreendimento geraria no estado. Relembrando que a maricultura gera os mesmos 14 mil empregos, setor esse que ainda tem muito para se desenvolver em Santa Catarina e de forma sustentável. Mas vamos então debater esses tais 14 mil empregos. Primeiro que são pelo menos 10 mil empregos indiretos, gerados em todo o processo de construção e manutenção do estaleiro, que tem prazo para ficar pronto e, conseqüentemente, prazo para desempregar. Apenas 4 mil vagas seriam de empregos diretos, quantia irrisória comparado com a geração de empregos no turismo, que depende intimamente da conservação do patrimônio natural para continuar gerando renda no estado. Santa Catarina é um dos destinos ecológicos mais respeitados do Brasil, não só pelas belas praias como também pela mata atlântica litorânea preservada (um dos maiores percentuais de conservação no Brasil) e região serrana, com seus cânions, cachoeiras e mata nativa. Na verdade, me parece que o argumento de geração de empregos no Brasil serve hoje para justificar qualquer ação, mesmo ela sendo a mais estúpida possível dentro do atual contexto ambiental, social e humano do planeta. Basta dizer que serão geradas algumas dezenas de empregos para que apóie a derrubada de florestas, a privatização de áreas da União (como é o caso da região costeira e matas nativas) ou mesmo o “desenvolvimento nas coxas” promovido pela ocupação de áreas sem qualquer fiscalização, planejamento ou vislumbre de uma estrutura sustentável. Enquanto os empregos forem gerados à custa da qualidade de vida do cidadão, fomentando as diferenças sociais – já que a maioria deles são subempregos, de baixa renda e com características exploratórias – e a exacerbação da importância do consumo e da notoriedade dentro de uma estrutura capitalista selvagem, não poderemos vislumbrar a manutenção desse belo estado da forma confortável e acolhedora, durante muito tempo.
Quanto ao senhor Eike Batista, o bonitão bilionário autor do projeto, há de se ressaltar que ele é um empresário que tem o lucro como objetivo, não o bem estar do cidadão. Um fato curioso e recente a respeito desse senhor foi a doação de 2 milhões de Reais feita por ele na campanha eleitoral desse ano. E para quem? Um milhão pra Dilma e outro para o Serra! Isso não me causou surpresa, apenas reforçou o papel que esse senhor tem na sociedade e como ele o desempenha. Fica claro o interesse desse sujeito apenas nos negócios, sem comprometimento ideológico ou posicionamento político. Estamos cansados de saber que o financiamento de campanha é uma troca de benesses entre grupos de interesse que nada tem a ver com o desenvolvimento do país e qualidade de vida do brasileiro. Dentro da realidade do “business” Eike exerce seu direito no jogo de toma lá dá cá da realidade Tupiniquim, mais isso não deve mais ser considerado uma condicionante para ascender economicamente no país, nem mesmo deve passar despercebida aos nossos olhos e senso crítico. É preciso saber quem são esses sujeitos para que possamos saber opinar melhor e de forma menos fragmentada.
Algumas das opiniões que ouvi, favorável a vinda do estaleiro e desfavoráveis a atual situação, a ida do empreendimento para o Rio de Janeiro, são de uma ignorância (daquele que ignora os fatos, ou o fato) descomunal. Como o foco da imprensa tem sido o meio ambiente emperrando o desenvolvimento – fato esse que colabora para a condição atual do clima e da sustentabilidade ecológica do planeta – muita gente tem se armado de cinco pedras em cada mão para acertar o primeiro golfinho que ver pela frente. Opiniões como “se matarem uma pessoa o culpado pode até não ser preso (Nota minha: se for rico né!), mas se matarem um animal com certeza serão”, ou até responsabilizando o empresariado catarinense, dito sectário e ortodoxo por alguns, são algumas das críticas feitas por quem não mora perto da área nem vai ganhar nada com o estaleiro. Não entendo como o empresariado catarinense, um dos principais segmentos a serem beneficiados com tal empreendimento, poderia ter investido contra a instalação do mesmo. Culpar políticos também tem sido pauta no debate sobre o tema, logo eles que tanto fizeram esforços para que o negocio saísse! Mesmo com o anúncio da ida do Eike pro Rio, para fazer a lambança dele lá, o governador em exercício Leonel Pavan chamou a OSX para conversar, na tentativa de salvar “algum” nessa história para Santa Catarina. Mas de que Santa Catarina estamos tratando? A dos empresários e políticos ou a do povo do mar, pescadores, ecochatos – como alguns gostam – que se reuniram as centenas durante meses nas audiências públicas para debater o projeto, que engrossaram o coro de descontentamento junto ao MP e aos órgãos ambientais, que numa atitude pouco comum a nossa realidade, fizeram cumprir-se a Lei! Infelizmente no nosso país as Leis são exercidas de acordo com a posição social e conveniência, e mesmo o cidadão mais simples, que não ocupa altos cargos e ganha muito, repete o discurso de contravenção social em detrimento da organização pelo bem estar coletivo. É preferível burlar as Leis para gerar os tais empregos, do que segui-la consciente da existência dela como instrumento de preservação ao que pertence ao coletivo, não apenas a mais um empresa de um cara cheio da grana. E, enquanto navios saem no estaleiro, os golfinhos ficam com o ônus da ignorância humana. Somos todos seres vivos, e o benefício de uns não pode significar a morte de outros. Se assim como os golfinhos somos parte da natureza, porque ainda nos colocamos na posição de julgadores dos destinos dos seres da Terra? Porque para o lucro de alguns podemos matar outros? Se temos mais direitos sobre esse planeta do que as demais espécies, nossa responsabilidade deve ser proporcional a posição que nos colocamos. Acho que vou contratar um advogado para os golfinhos, coitados... Gerações e gerações usaram aquela baia como ponto de parada e agora são responsabilizados pela frustração de uma vontade imediatista humana. Acho que vou contratar o advogado para processar por calúnia e difamação aqueles que insistem em culpar os golfinhos pela ignorância do homem.
Osíris Duarte
Muito bom artigo!
ResponderExcluirParabéns!!
Parabéns mesmo! VC sintetizou, muito mehor do que eu faria, tudo o que penso sobre o estaleiro e essa forma que escolhemos para alacançar o "progresso". Tomei a liberdade de replicar o texto no meu blog, indicando a autoria e seu blog.
ResponderExcluirOsiris, sempre disse que seria a favor se nao houvesse dano ambiental comprovado por tecnicos, Eike fez um estudo fajuta e contestado, saiu do processo 1 mes antes da decisao da ministra. a culpa é do Eike por ter usado SC para levantar grana na bolsa. A natureza e o desenvolvimento podem andar juntos, é so cumprir a lei. parabens pelo artigo
ResponderExcluirAlfredo Silva Biguaçu