Fico impressionado com a agilidade da polícia quando se trata de prender militantes sociais. Rapidamente se fazem escutas telefônicas e se efetuam prisões arbitrárias e sem base legal. Mesmo sendo de conhecimento público quem é o traficante do bairro, ou o ladrão da região, ou mesmo quando se há provas cabais de corrupção, como filmagens de recebimento de propina, a rapidez e eficiência da polícia, nesses casos, se compara a uma lesma em uma parede oblíqua. Fico perplexo porque ainda há aqueles que acreditam que vivemos realmente em um Estado de Direito, onde há democracia e liberdade. Não vivi a ditadura dos anos 60 e 70, no século passado, mas vivo hoje a ditadura do século XXI. Aquela que é tão repressora e autoritária quanto a que se foi, mas com o agravo da máscara da democracia.
Na noite de quinta-feira e na madrugada se sexta, três integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra de Santa Catarina (MST), foram presos durante uma reunião com representantes comunitários do município de Imbituba, sul do estado. A reunião era com catadores de material reciclável da região e representantes de Associações Comunitárias, e tinha como objetivo estruturar uma cooperativa de catadores no município. O MST, com larga história de organização de cooperativas, contribuía com a comunidade na estruturação do trabalho cooperado desses catadores. Foi ai que a Policia Militar chegou, leu o decreto de prisão preventiva e levou sob custódia o coordenador estadual do MST em Santa Catarina, Altair Lavratti. Na madrugada de sexta, outros dois colaboradores do MST no estado, Marlene Borges, presidente da Associação Comunitária Rural do município, e Rui Fernando da Silva Júnior, líder comunitário, foram presos em suas residências sob a acusação de envolvimento com um grupo suspeito de planejar invasões em áreas públicas. Marlene está grávida de três meses, uma gravidez de risco. A alegação da PM e do poder judiciário é de que o movimento estava comprando o apoio de populares e articulando para invadir uma área doada pela União ao Governo do Estado, as margens da BR-101 do município catarinense. Segundo a polícia, escutas telefônicas davam conta da articulação de tal ação.
O que a grande e imprensa não dá conta de explicar, assim como em casos de corrupção, onde as informações saem nos jornais antes mesmo da investigação e do julgamento serem concluídos, é como a PM tem a prerrogativa de efetuar tais prisões, que no caso caberia a Polícia Civil, e como se pode prender alguém sem cometer crime algum?! Sim, porque por mais que houvesse alguma articulação do MST para ocupação de área pública, tal ação nunca foi realizada, o que não configura crime. O direito de se organizar e de se reunir está amparado na constituição, é um direito de qualquer cidadão. Freqüentemente os ataques a movimentos legítimos, de conhecimento público e que visão a garantia de direitos do povo são combatidos com mais ardor, paixão e razão do que qualquer crime de corrupção, latrocínio, roubo ou estelionato. Se a polícia atuasse com tanto propriedade como no caso do MST, onde para prender três pessoas desarmadas e pacíficas foram usados mais 30 policiais do já tão insuficiente efetivo do estado, talvez vivêssemos em um estado mais seguro, em um país mais justo.
Na tarde dessa sexta-feira, membros de mais de 30 entidades sindicais e sociais do estado, além de estudantes, simpatizantes do MST, imprensa e políticos, estiveram no auditório do Sindicato dos Bancários de Florianópolis para repudiar a ação da PM a serviço das elites, das prisões políticas e da cobertura no mínimo anti-jornalística da RBS, empresa de comunicação privilegiada na pauta. Inclusive com a presença de repórteres da empresa, a direção estadual do MST deu sua versão do caso. Obviamente o furo de reportagem já havia sido dado, sem ouvir antes, é claro, o movimento. Convenientemente marcaram presença na reunião, para arrotar a conduta “jornalística” de quem bateu primeiro para depois ouvir a versão do agredido.
Nessa reunião forma levantados fatos ainda não bem explicados a respeito da forma como a policia atuou no caso e sobre as informações divulgadas pela imprensa. Lavratti foi preso às 21 horas de quinta, não teve direito a um telefonema, foi transferido para o presídio de tubarão e só se teve notícias dele na manhã de sexta, por volta da 6 horas da manhã, depois que uma comitiva com o advogado do Movimento e representantes de entidades de classe foi para região tentar localizá-lo. Até esse momento as notícias sobre o estado dele e dos demais companheiros só corria pela RBS. Sem direito de ampla defesa, já que não pode fazer uma ligação para avisar a família e chamar um advogado, sendo transferido na madrugada para fora do município onde foi expedido o mandado de prisão preventiva, o dirigente do MST foi submetido a uma situação que lembra muito os tempos da ditadura “aberta”, quando todos sabiam como a banda tocava. A situação me fez lembrar das prisões de cunho político nas décadas de 60 e 70, quando o sujeito era preso sem nenhuma explicação plausível e depois sumia para aparecer morto ou não aparecer mais. Mesmo no Fórum de Imbituba, local onde se deveria cuidar da justiça, as informações eram sonegadas. Representantes do MST do estado tentaram obter informações sobre o paradeiro de Lavratti ou sobre o processo e ouviam desculpas enroladas, do tipo: quem sabe não chegou, ou não está! Outro fato estranho foi a tal compra de apoio de populares para ocupação. Segundo a coordenação do MST não houve compra de apoio. Lucindo Bravanel, da direção estadual do movimento reivindicou a prova de que houve pagamento para pessoas da comunidade para participar da ocupação: “Um movimento de pessoas pobres pagando 2 mil Reais por família para realizar ocupação é um absurdo! Essa é uma informação difamatória e a policia terá de provar tal acusação”. O que não falta são mentiras, principalmente na mídia, essa fala é minha e afirmo com conhecimento de causa.
Meus caros, muito se houve a respeito do MST na mídia. Que são vagabundos, baderneiros, vândalos... Mas pense você, pessoa inteligente, tudo o que ouvimos por ai serve como verdade? Porque as coisas que saem na Globo, RBS, SBT, Record e demais veículos de imprensa sustentados por grupos de interesses políticos e econômicos, grandes empresas que fomentam a ignorância BBBniana, fazendista e “jornalisticamente inrreprencívies”, porque mostram sujeitos articulados de terno falando no palco televisivo, cheio de tvs de plasma no fundo é com dinheiro a rodo pra fazer o que quiser, são consideradas verdades incontestáveis? Porque o Bonner é bonitão? Porque a RBS tem helicóptero? Eu sou jornalista e sei o quanto isso não significa nada em relação ao caráter dos profissionais. Na faculdade não tem cadeira para ensinar isso. Mas no mercado de trabalho tem. Uma disciplina chamada submissão para sobrevivência. Ou vocês acham que são os jornalistas que pautam e que ditam a linha do discurso editorial? São as empresas meus caros. E como empresas tem interesses empresariais e políticos, não populares. Aliás, o povo só atrapalha as políticas e interesses de tais empresas. Antes de fazer seu juízo de valor, formar sua opinião, seja sensato e não se apóie apenas no que ouve na tv, rádio ou lê no jornal. Eu descobri isso indo atrás, saindo às ruas, vendo eu mesmo as situações. Como jornalista sindical que estou hoje, muitos podem achar tendenciosa minha opinião. Pois digo que ela é sim parcial. Não existe jornalismo sem uma formação política, ideológica e filosófica. A grande mentira do jornalismo são as máscaras da pluraridade e imparcialidade. Informações não significam nada, pois elas podem ser usadas ao bel prazer de quem as divulga, seja para falar a verdade ou para contar uma mentira. É como essa história de estatística. Os caras pegam um dado tipo: De 2001 à 2009 cresceu 80% a divida do estado – só um exemplo ta gente. Ai a gente diz: Nossa! Que absurdo! Mas os oito anos no meio dessas datas guardam razões e fatos que às vezes não representam a dimensão do número. Assim é a informação gente. Sem conhecimento e sem sabedoria ela não significa nada. Pode ser distorcida para o lado que convém. Basta contar a história direitinho que sempre haverá um número, um sinônimo, um conceito e uma descoberta da ciência para justificar até mesmo o que há de pior nesse mundo.
Quanto à ação da polícia e do judiciário nada de novo no Reino da Dinamarca ou, se preferir, na República das Bananas. O braço armado a serviço do Estado e o poder de quem determina o que é justo sempre atuou e continuará atuando de forma autoritária e a serviço de quem detém o poder, e não são necessáriamente aqueles que acupam cargos de governo. Por mais que gostaríamos de uma polícia e de uma justiça a serviço do cidadão, do povo, isso não vai acontecer. A melhor forma de reprimir ainda continua sendo através do medo, e é assim que se faz conosco todos os dias. Eles dizem: fique na sua que nada vai te acontecer. Não se organize, não reivindique, não cobre, fique na sua que, talvez, sobre alguma migalha pra ti no final. E então nos amedrontamos ou pior, nos conformamos. E no final, ainda nos achamos livres...
Para entender: Que área é essa?
A área em questão que serviu de palco para a ação da polícia, mesmo sem nada ter acontecido nela, foi doada pela União ao governo de Santa Catarina. Sem um uso definido para o local, um projeto de Lei foi aprovado da Assembléia Legislativa doando a área para o município de Imbituba. O Plano: Construir ali um condomínio empresarial as margens da 101 que, até lá, estaria duplicada. Esse é um dos pontos obscuros no esquema, já que tal medida é inconstitucional, pois, sendo doada pela União e não utilizada pelo beneficiado, no caso o estado de Santa Catarina, a área deveria ser devolvida a União, não podendo ser doada ao município. Na época o governador vetou o projeto que, ao retornar a ALESC, teve o veto derrubado.
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