terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Preciso lutar com afeto para existir

  Sempre luto por aquilo que quero na vida. E, em meio a essas batalhas, descobri que a luta não se faz apenas no físico, mas sim no psicológico e no espiritual. Nossa mente é um campo de batalha mais acirrado do que os frontes de guerra no mundo humano. Nela, travamos lutas homéricas diariamente e sofremos derrotas e vitórias no tempo de um piscar de olhos. Lutar é preciso para descobrir como é batalhar verdadeiramente. Lutar é viver querendo viver e, mesmo quando nada parece no lugar, temos um sentimento de felicidade e satisfação, porque descobrimos que temos a força para vencer, mesmo quando perdemos.

  Talvez eu esteja errado, ou sendo por demais pretensioso, mas percebo que muitos dos problemas existenciais que cultivamos estão no conformismo de luta. Achar que lutar é a penas trabalhar ou estudar, acumular ou ter sucesso e status é se entregar a um conceito simplista do entendimento do compromisso de existir. Pessoas com todos os privilégios possíveis desse mundo não conseguem enxergar o mérito de lutar como um compromisso perante aquilo que acham que acreditam. Digo acham porque muita gente não sabe mesmo o que quer. Mas descobrir o que realmente queremos também é um compromisso de luta. Devemos nos propor a tanto. Experimentar e vivenciar a multiplicidade do que compõe o Ser Humano é se propor a assumir a vida como ela se apresenta, ajudando a construí-la de acordo com a vibração que se emana para o mundo. O compromisso de busca, com serenidade e fé, é algo fundamental para dar sentido as nossas vidas.

  Fé é crença são coisas distintas e cada uma desempenha seu papel na vida. Acreditar precisa de um amparo racional. Seja ele ideológico, cultural, histórico ou filosófico. Mas a fé não se ampara em tais argumentos, ela é a crença amparada pelo sentimento e pelo espírito. Esse sentir, por mais que a psicologia tente explicar através das relações químicas da psique e pelas patologias desenvolvidas pela vida moderna, reside em uma realidade que transcende nossa capacidade de explicação racional. A razão absoluta não se ampara apenas no conhecimento, mas sim no equilíbrio entre as várias nuances que compõe nosso ser. Por isso que aquilo que fazemos com fé, por mais cego que alguns possam argumentar que seja, é o que realmente move montanhas na nossa vida.

  Não sou um sujeito religioso. Nunca fui. Transitei por várias doutrinas, filosofias e crenças até ter certeza que não precisava disso para estabelecer meu contato com o divino, com meu eu espiritual. Assim como não é necessária religião para ter essa resolução, não é necessário nenhum amparo racionalista para se ter fé. Não acho que devemos desconsiderar o papel da religião na vida humana, mas vejo que ela é só um meio, mais um caminho para descobrir o quanto precisamos de Deus para viver e atingir nosso objetivo nessa vida. Alguns podem chamar Deus de muleta, uma fuga da realidade para se sentir mais feliz. Pra mim é contraditória tal visão, porque, afinal, quem não quer ser feliz? Aquele que se conforma com o sofrimento padece da covardia humana perante a grandeza da existência. Às vezes sinto que falta humildade para reconhecer que precisamos da ajuda dos outros e, consequentemente, da divindade que congrega a existência individual e coletiva.

  Os que são por demais materialistas dizem: isso é alienante, apenas uma desculpa para se eximir das responsabilidades sobre os problemas do mundo. Penso que alimentamos os problemas quando exacerbamos sua relevância em detrimento da felicidade. Aprendi que não é necessário sofrer para cumprir nosso papel, ou pelo menos o que nos colocamos como sendo nosso papel. Pelo contrário, estar bem e feliz aperfeiçoa nossas ações, melhora nosso discernimento e beneficia todos a nossa volta.

  No Nordeste – minha região de origem – me deparei com muitos exemplos de sabedoria, coisa que não se adquire apenas a través do acúmulo de conhecimento ou informações. Sabedoria se adquire principalmente através do viver a vida feliz. Felicidade, assim como a tristeza, é efêmera, passa, mas a plenitude de ser feliz está justamente nessa consciência, a da impermanência dessa vida. Viver assim nos permite enxergar nosso universo de sentidos de cima, vivendo feliz mesmo triste, sabendo que aqui e agora temos mais uma oportunidade de crescer e aprender. Pobre daquele que acha que viveu tudo e aprendeu tudo... Lá na Paraíba vi gente analfabeta e pobre com mais sabedoria que muitos catedráticos da UFSC! Lá vi gente com valores empíricos, sem a contaminação do conhecimento humano - arrogante e autoritário. Lá vi sorrisos tão sinceros e atitudes de humildade e solidariedade que NUNCA vi na academia. Em meio a tantos apelos conheci gente que escuta e aceita o que lhe dizem, mesmo não concordando com o que ouviu. Lá vi uma educação baseada no afeto e vi a disposição das pessoas em interagir, se aproximar e demonstrar carinho e apreço até por desconhecidos.  Não que todos lá sejam assim, mas o povão de lá, esse sim é sábio.

  Afirmo novamente, assim como já afirmei em outro texto nesse blog, que conhecimento teórico não determina caráter nem sabedoria. A prática carrega em si algo que considero mais relevante, a disponibilidade de dar, a generosidade, seja ela em benefício próprio ou do próximo. Afinal o que veio primeiro, a teoria ou prática? Não foi tentando que descobrimos como se faz? Como são as coisas? Não foi buscando que formamos opinião? Não foi vivendo que chegamos às conclusões que temos? Não foi com exemplos que adquirimos experiência? O conhecimento teórico é importante sim, mas por si só não diz nada. Ele é algo que outra pessoa considerou através da própria caminhada, pode nos dar uma idéia, mas não é absoluto. A atitude, mesmo que a princípio seja sem ter base em um argumento plausível para todos, carrega em si os condicionantes íntimos da atuação individual perante o mundo e, portanto, tem dentro dela a necessidade psicológica, intelectual ou espiritual de cada um de nós. Assim, ela se torna a principal força de movimento, que repercute no íntimo e no todo, mudando as coisas, seja para o bem ou para o mal. Isso é a condição da constante busca de equilíbrio do universo, isso é manter a sinergia, o movimento. Essa mania de achar que o que achamos é melhor para todos é a velha pretensão intransigente da humanidade. Cada um de nós tem um universo particular a desvendar-se, e se somos solidários respeitamos a caminhada de cada um. Viver em sociedade de forma plena, pra mim, passa por isso, pela consciência de que liberdade não combina com imposição ou autoritarismo, mesmo que disfarçada de sabedoria.

  Essa é uma reflexão pessoal. É a minha régua, como faço minha medida do mundo e da vida. Ela me serve, me faz querer ser, mas talvez não sirva para você. E é isso que faz com que viver não se traduza no conflito, pois a diversidade é uma condição evolutiva, viver é a ação consensual sem submissão, seja ela intelectual, afetiva ou espiritual. Não me considero sábio. Mas a sabedoria é sim um objetivo. Não me bastam só os livros ou a história humana, eu preciso de mais, eu preciso da vida na sua amplitude total. É por isso que luto e me proponho a viver na plenitude da diversidade, considerando a infinidade de pontos a serem desvelados. É por isso que tenho fé em Deus, não apenas acredito. É por isso que considero meu coração e minha intuição antes do que diz minha mente, já que ela é tão sujeita as mudanças promovidas pelas batalhas do viver. É que simplesmente preciso existir.

Osíris Duarte 05/01/10  

 www.palavraodoosi.blogspot.com
 





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