terça-feira, 29 de abril de 2014

Crônicas de Gaveta - Banzé


  De cima do tronco, Banzé, o chimpanzé, fitava a menina de vestido rodado. Ela comia pipoca, tomava suco gelado e fitava Banzé de volta. Meio de lado, o macaco olha admirado as cores do vestido dela, bem cuidado, colorido, decorado... A menina se chama Ana e, enquanto ele mastiga a banana, ela acena e chama adoidado. Quero ver o macaco já Nana! Dizia para a Babá que mesmo no fim de semana estava lá, a trabalhar, a lhe cuidar sem merecer. Ana era mimada, adulada e voluntariosa. Não tinha proza de criança doce. Fosse o que fosse seria feita sua vontade. Sua mãe ficava perplexa com nossa sociedade, então tomava mais uma dose de hipocrisia todas as manhãs. Já Banzé não sentia desejos complexos, mas para ele não tinha nexo só água, comida e teto. Via as flores coloridas ali perto, na cerca. No vestido de Ana o vento balançada solto, atrás do muro e, mesmo quando escuro, olhava as pessoas ali no vai e vem, pela cerca, envoltos no absurdo... Mas a maior contradição daqueles que pensam ser o símio superior, que comparam a dor com a destreza, vivendo no temor da incerteza de sua superioridade, esquecem que na verdade nesse zoológico, por de trás das grades, no viveiro utópico concebido como realidade, mora Ana, sua mãe, Nana, e toda humanidade, enquanto Banzé clama piedade aos céus ao nos ver réus da nossa própria iniquidade. 

Osíris Duarte

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